terça-feira, 31 de julho de 2007

Na trilha de Jabor

Foto: Andréia de Oliveira
Hoje pela manhã quando tomava meu café, na padaria perto de casa, pensava no meu blog, e mais ainda, estava com a certeza que deveria escrever um texto para postagem. Várias idéias pasavam sem cessar pela minha cabeça, também, no país em que vivemos o que não falta é escândalo, cada dia acontece um diferente, o que muda é a gravidade. Em meio a tantos pensamentos, lembrei que hoje é terça-feira, dia em que Arnaldo Jabor, de quem sou fã, escreve para o jonal O Estado de São Paulo. É só ficar sabendo que ele estará presente em tal evento, aqui em São Paulo, que lá vou eu com minha câmera fotográfica e com meu gravador. E foi ao ler a crônica de hoje, " Os aviões andaram bebendo", que tive a idéia de coloca-la no meu blog. É como se todos os meus pensamentos de minutos atrás, estivessem reunidos em uma sequência.

"Os aviões andaram bebendo

As coisas é quem têm culpa de tudo, o piano andou bebendo," the piano has been drinking!" cantou Tom Waits, "my necktie is asleep", minha gravata está dormindo, "the jekebox is taking a leak", a vitrola foi mijar, o tapete precisa de um corte de cabelo, o afinador de piano é surdo e eu, cá comigo, continuo: os Boeings e lagacies e airbuses andaram enchendo a cara também, enquanto os jornais teimam em nos propagar catástrofes que, no dizer das autoridades, se produziram sozinhas como cogumelos autóctones, enquanto o presidente some sob as vaias do Pan e, magoado, se esconde sob os terçóis do palácio, iluminado pela aura do botox que resplende da primeira-dama muda e as pistas dos aeroportos rolam de porre debaixo de chuva, as turbinas se revoltam, as asas tatalam e se partem, os motores se recusam a rodar e destroncam a língua em palavrões, as medalhas vêm pousar como gafanhotos nos peitos dos canalhas, os pepinos se enfiam nos rabos dos brigadeiros, os mortos berram com orgulho que são cadáveres verde-e-amarelo, cem por cento nacionais e os "groovings" não são "groovy", as ranhuras viram regos arrombados, os pneus rebolam como gelatinas, os trens-de-aterrisagem são aleijados, os radares são morcegos drogados e os controladores são cegos de um olho e não enxergam com o outro.
As petistas eróticas gozam fumando charutos, os puteiros erupem como vulcões de esperma a beira da pista, no caminho dos "airbuses", as gargalhadas roncam nas gargantas dos ministros, a palma da mão de Deus bate contra seu sagrado punho fechado e um imenso "top top" atroa os espaços e dedos imensos se esticando do céu e nos mandam enfiá-los, deus sabe aonde, e os mortos teimam em morrer e os traficantes de órgãos ficam desolados com o desperdício de corpos. Os vivos não cooperam e as pistas continuam em coma e os aviões fumam maconha e os pilotos aterram aterrados e os taxistas vigiam preocupados os negros céus de São Paulo, os pássaros vivem em pânico e resolvem andar a pé nas estradas esburacadas, com as verbas de recuperação roubadas no Ministério dos Transporte, os cachorros cagam nas pistas, o ministro da Defesa se derrete e escorre para o ralo, duzentos milões de dólares fogem às gargalhadas dos cofres da Infraero e ninguém faz nada, ninguém investiga e a grana toda voa sobre a Anac que gruda o rabo do diretor na cadeira para impedir sua demissão, pois ele diz que a competência é irrelevante e que seria covardia sair agora.
Entrementes: o presidente do Senado sob suspeita (lembram como é o nome dele?) exulta com as catástrofes pois, talvez, o olvidem para sempre, esqueçam os envelopes que voaram sozinhos para os bolsos, vindo das empreiteiras, dos açougues onde as carcaças de bois se esquartejavam em notas frias, a Gautama também comemora (como é o nome dele?), o Zuleidão mergulha eufórico nos canais de esgoto a céu aberto, enquanto os viadutos interrompidos choram de solidão, as barragens morrem de sede, as lâmpadas do "luz para todos" mergulha nas trevas, o Roriz roreja sua lama na falta de memória do povo, os intelectuais continuam calados, a USP dorme o sono dos injustos.
Em meio a isso tudo, o Rio São Francisco fervilha de piranhas e se recusa a ser desviado, o bispo exibicionista se empapuça de hóstias consagradas e se prepara para nova greve de fome, a opinião pública abraça lagoas e usa camisetas com a palavra paz, o Pan acaba, os traficantes comemoram o ouro que já vem vindo de novo por aí, nas linhas vermelhas e amarelas, enquanto os narizes de celebridades celebram e fazem surubas, felizes com o pó que vai voltar a chover em Ipanema e nos Jardins, as comissões de inquéritos continuam a dizer que a culpa de tudo é do amigo do Homem Aranha, que tudo foi mais uma missão do "Capitão Falha Humana", com sua caceta sobre o planeta, que tudo é erro dos pilotos, provalvelmente pilotos mansos, com dor-de-corno, largados pela mulher, enchendo as caixas-preta de lamúria, lágrimas e sambas-canção, o que os fez deslocar manetes e manchos num desatino de ciúme, empapuçados de Lexotans ou senão dores-de-corno de urubus traído por papagaios sem-vergonha, que cometeram suicídio, enfiando-se loucamente dentro as turbinas invertidas sobre os lixões.
Concomitantemente, os papéis onde o Executivo escreveu o PAC serão usados como papel higiênico no Planalto para poupar dinheiro, de modo a haver verba para contratar mais 600 imbecis para o Professor Pardal Mangabeira erguer o seu queixinho fascista com sotaque americano, em vez de contratar controladores de vôo novos, tudo isso rolando enquanto Renan não aguenta mais o tal recesso parlamentar, porque a esposa agora está se vingando no recesso do lar, emanando rancor e acusações mudas pelos cantos das fazendas imaginárias, enquanto continua a dúvida se veremos ou não as partes intimas de Mônica (dobrem a oferta, Playboy...), enquanto a dama do charuto da Anac diz que o acidente não foi no ar, logo não tem nada a ver com ela.
Finalmente, como não temos mais palavras para exprimir nossa indignação, ou melhor, como não temos mais indignação para exprimir em palavras, ou melhor ou pior ainda, como não há mais nada para exprimir ou espremer, precisamos saber urgentemente se o Olavo vai ƒ... a vida de Fábio Assunção, se Taís vai estrangular a irmã Paula e principalmente questões fundamentais como saber se "em trilha de paca, tatu caminha dentro, se jacaré no seco anda, se cavalo que galopa na bunda sua...", em suma, as coisas importantes da vida como, por exemplo, se o passaralho vai continuar voando ou se "passarinho que come pedra sabe o c...que tem"? Será que já sabe?
E fica a certeza de que a única lei que é respeitada no País é a Lei de Muphy e que a única coisa profunda que ouvi ultimamente foi daquele americano expluso: " Welcome to Congo!" O Congo é aqui mesmo."

ARNALDO JABOR

Um comentário:

Anônimo disse...

Acho que devemos aceitar cada vez mais a ordem natural das coisas e acreditar que todo o caos que assombra o País não tem como envolvimento o governo e donos das tais empresas. Aliás, quem somos nós, meros cidadãos obrigados a optar por esses 'representantes' para contestar, julgar, acusar, conspirar contra o ótimo governo que o Brasil possui?

O governo está isento a tudo isso, os donos da Infraero, Anac, Sérgio Cabral e o grande investimento no PAN, nada tem a ver com a catástrofe brasileira...
Já que não posso contestar isso, só me resta uma pergunta: que bebida os aviões estão tomando ultimamente?